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O rotacional

A partir do operador diferencial $ \vec{\nabla}$ obtivemos o gradiente de um campo escalar, $ \vec{\nabla}f$, e o divergente de um campo vetorial, $ \vec{\nabla}.\vec{V}$. Uma terceira operação possível é a seguinte: seja $ \vec{V}(x,y,z)=V_{x}\vec{\i}+V_{y}\vec{\j}+V_{k}\vec{k}$ um campo vetorial. O operador diferencial nabla é

$\displaystyle \vec{\nabla}=\frac{\partial}{\partial
x}\vec{\i}+\frac{\partial}{\partial
y}\vec{\j}+\frac{\partial}{\partial z}\vec{k}
$

Logo, pode-se pensar em definir $ \vec{\nabla}\times \vec{V}$, o produto vetorial de $ \vec{\nabla}$ pelo campo vetorial $ \vec{V}$. Temos
$\displaystyle \vec{\nabla}\times \vec{V}$ $\displaystyle =$ $\displaystyle \left(\frac{\partial}{\partial x}\vec{\i}+
\frac{\partial}{\parti...
...{\partial
z}\vec{k}\right)\left(V_{x}\vec{\i}+V_{y}\vec{\j}+V_{z}\vec{k}\right)$ (85)
  $\displaystyle =$ $\displaystyle \frac{\partial V_{y}}{\partial x}\vec{\i}\times \vec{\j}+
\frac{\...
...x}\vec{\i}\times\vec{k}+\frac{\partial
V_{x}}{\partial y}\vec{\j}\times\vec{\i}$  
  $\displaystyle +$ $\displaystyle \frac{\partial V_{z}}{\partial y}\vec{\j}\times\vec{k}+
\frac{\pa...
...z}\vec{k}\times\vec{\i}+
\frac{\partial V_{y}}{\partial z}\vec{k}\times\vec{\j}$ (86)

que dá, realizando os produtos vetoriais e simplificando,

$\displaystyle \vec{\nabla}\times \vec{V}=\left(\frac{\partial V_{z}}{\partial y...
...ac{\partial V_{y}}{\partial x}- \frac{\partial V_{x}}{\partial y}\right)\vec{k}$ (87)

$ \vec{\nabla}\times \vec{V}$ denomina-se o rotacional do campo vetorial $ \vec{V}$, e é, também ele, um campo vetorial.

Como regra mnemônica costuma-se usar

$\displaystyle \vec{\nabla}\times\vec{V}= \left\vert\begin{array}{ccc} \vec{\i} ...
...y}& \frac{\partial}{\partial z}\\  V_{x} & V_{y} & V_{z} \end{array}\right\vert$ (88)

Este determinante simbólico5 deve ser expandido, à maneira de Laplace, em relação à primeira linha. Desta forma reproduz-se (87).



O leitor tem todo o direito de estar curioso. Que bichos são esses? Quando é que um campo tem divergente zero? Quando é que tem rotacional zero? Quando é que não tem? Por que todas essas definições?

Mais tarde, quando tivermos à disposição os teoremas integrais de Gauss-Ostrogradskii e Stokes, poderemos mostrar com simplicidade o campo vetorial típico com divergente zero e aquele com rotacional zero. Os nomes desses operadores encontrarão também uma justificativa. Neste meio tempo vamos apresentando alguns resultados parciais.



Exemplos:
(1) Um campo vetorial uniforme tem tanto o divergente quanto o rotacional iguais a zero, pois as derivadas parciais de todas as componentes são nulas.
(2) Considere o campo vetorial definido assim: seja $ P$ o ponto de coordenadas ($ x,y,z$). Toma-se o vetor que parte da origem até o ponto $ P$, e se o transporta, sempre paralelo a si mesmo, até que sua origem seja o ponto $ P$. Chamaremos este campo vetorial simplesmente de $ \vec{r}$. Note que o vetor associado à origem é o vetor $ \vec{0}$. Este campo tem divergente não-nulo. De fato, $ \vec{\nabla} . \vec{r}=3$. Os vetores ``divergem'' a partir da origem. O rotacional deste campo é zero, como é imediato verificar.
(3) Considere um disco rígido no plano $ xy$ girando, com velocidade angular constante, em torno do eixo $ z$ que passa pelo seu centro. Em cada ponto do disco, seja $ \vec{v}$ o vetor velocidade do ponto. Obtém-se assim um campo de vetores que são tangentes a círculos de centro na origem e que estão todos no plano $ xy$. Conseqüentemente, $ v_{z}=0$ em todos os pontos. Seja $ \vec{\omega}$ um vetor ao longo do eixo $ z$ cujo módulo é igual à velocidade angular $ \omega$ do disco, e cujo sentido é o sentido positivo do eixo, se a rotação for anti-horária. Então o campo vetorial pode ser descrito de uma forma simples:

$\displaystyle \vec{v}=\vec{\omega}\times\vec{r}$ (89)

Como $ \vec{\omega}=\omega \vec{k}$ e $ \vec{r}=x\vec{\i}+y\vec{\j}$,

$\displaystyle \vec{v}=\vec{\omega}\times\vec{r}=\omega x\vec{\j}-\omega y\vec{\i}$ (90)

O cálculo do rotacional dá:

$\displaystyle \vec{\nabla}\times\vec{v}=\left\vert\begin{array}{ccc} \vec{\i} &...
...x & 0 \end{array}\right\vert =0\vec{\i}+0\vec{\j}+2\omega\vec{k}=2\omega\vec{k}$ (91)

O leitor não terá dificuldades em mostrar que, por outro lado, $ \vec{\nabla}.\vec{v}=0$. O campo de vetores ``roda'', e o seu ``rotacional'' é diferente de zero. O rotacional foi introduzido pelo grande físico e médico Hermann von Helmholtz para descrever turbilhões em fluidos, como os tornados na atmosfera. Para uma descrição mais completa de seus grandes trabalhos, veja ([15]).
(4) Considere agora um disco de poeira cósmica girando em torno de uma estrela, supondo, por simplicidade, órbitas circulares. Cada grão de poeira é um planeta, e se move segundo as leis de Kepler. A que nos interessa é a terceira, que é obtida impondo que a força de atração gravitacional coincida com a força centrípeta.

$\displaystyle \frac{GMm}{r^2}=\frac{mv^2}{r}$ (92)

ou

$\displaystyle v^2=\frac{GM}{r}$ (93)

(aqui, naturalmente, $ G$ é a constante de gravitação universal, e $ M$ é a massa da estrela). No exemplo anterior vimos que um vetor tangente a um círculo no plano $ xy$ tem a forma $ k(-y\vec{\i}+x\vec{\j})$. Portanto, podemos afirmar que a velocidade do grão de pó que está numa órbita circular de raio $ r$ é

$\displaystyle \vec{v}=k(-y\vec{\i}+x\vec{\j})$ (94)

com $ k$ tal que

$\displaystyle v^2=\frac{GM}{r}$ (95)

Isto determina completamente o campo de velocidades, que é dado por
$\displaystyle v_{x}$ $\displaystyle =$ $\displaystyle -\sqrt{GM}\frac{y}{\left(x^2+y^2\right)^{\frac{3}{4}}}$ (96)
$\displaystyle v_{y}$ $\displaystyle =$ $\displaystyle \sqrt{GM}\frac{x}{\left(x^2+y^2\right)^{\frac{3}{4}}}$ (97)

O cálculo do rotacional dá (bom exercício!)

$\displaystyle \vec{\nabla}\times \vec{v}=\sqrt{GM}\frac{1}{2r^{\frac{3}{2}}}\vec{k}$ (98)

É também um bom exercício mostrar que o divergente deste campo de velocidades também é zero.

As figuras abaixo exibem campos típicos com rotacional não-nulo e com divergente não-nulo.

\resizebox{8cm}{8cm}{\includegraphics{rotfull.eps}}
\resizebox{8cm}{8cm}{\includegraphics{divfull.eps}}

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Henrique Fleming 2003-08-11