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O teorema do divergente

O teorema do divergente, ou de Gauss, é o instrumento matemático que melhor permite visualizar que tipos de campos vetoriais possuem divergente não-nulo. Vamos enunciá-lo num contexto concreto. O problema é o seguinte: a figura abaixo representa uma região cúbica do espaço por onde flui uma corrente de água. Trata-se de um cubo geométrico, sem existência física: uma porção do espaço. Queremos calcular quanta água sai do cubo num intervalo de tempo $ \delta t$, ou, mais precisamente, a diferença entre a quantidade de água que sai e a que entra. Naturalmente, supõe-se que a única maneira de a água sair do cubo, ou entrar nele, é atravessando uma de suas faces.
\resizebox{8cm}{6cm}{\includegraphics{cubo.eps}}
Os eixos coordenados são escolhidos de maneira que sejam perpendiculares às faces. O centro do cubo é o ponto de coordenadas ($ 0,0,0$). Assim, os vetores $ \vec{\i}$, $ \vec{\j}$,$ \vec{k}$, são vetores unitários normais, cada um a um par de faces. Tomemos, em cada face, a normal externa. Então, por exemplo, na face em $ dy/2$, a normal externa $ \vec{n}$ será $ \vec{\j}$, ao passo que, na face em $ -dy/2$, $ \vec{n}$ será $ -\vec{\j}$.

Suponhamos que as faces do cubo sejam suficientemente pequenas para que o valor da velocidade da água nos vários pontos de uma face possam ser considerados iguais. (Se não for, diminua-se o cubo!). Na figura abaixo vemos como calcular a quantidade de água que atravessa uma face, no tempo $ \delta t$.

\resizebox{6cm}{8cm}{\includegraphics{volume.eps}}
A quantidade

$\displaystyle \vec{v}.\vec{n} dS$ (99)

é o volume da região tracejada. Na unidade de tempo, toda a água que estiver aí dentro atravessará $ dS$, e nenhuma outra. Então, se $ dS$ for a superfície de uma face do cubo e $ \vec{n}$ for a normal externa. no intervalo de tempo $ \delta t$, um volume de água dado por

$\displaystyle \vec{v}.\vec{n}dS \delta t$ (100)

atravessará essa face. Consideremos a face localizada em $ dy/2$. O volume de água que atravessará a face é

$\displaystyle \vec{v}(0, \frac{dy}{2},0).\vec{\j}dS\delta t = v_{y}(0,\frac{dy}{2},0) dS \delta t.$ (101)

Como $ dS=dx dz$, isto é igual a

$\displaystyle v_{y}(0,\frac{dy}{2},0)dx dz \delta t$ (102)

Usando a fórmula dos acréscimos finitos

$\displaystyle v_{y}(0,\frac{dy}{2},0)=v_{y}(0,0,0)+\frac{dy}{2}\frac{\partial
v_{y}}{\partial y}
$

de modo que (102) pode ser escrita

$\displaystyle v_{y}(0,\frac{dy}{2},0)dx dz \delta t=\left(v_{y}(0,0,0)+\frac{dy}{2}\frac{\partial v_{y}}{\partial y}\right)dx dz \delta t\;.$ (103)

A face oposta contribui com

$\displaystyle \left(-v_{y}(0,0,0)+\frac{dy}{2}\frac{\partial v_{y}}{\partial y}\right)dx dz \delta t\;.$ (104)

de modo que a soma das duas é

$\displaystyle \frac{\partial v_{y}}{\partial y}dx dy dz \delta t\;.$ (105)

Cada par de faces tem uma contribuição análoga. Somando tudo, temos

Volume que sai$\displaystyle \;\;=\;\;\left(\frac{\partial v_{x}}{\partial x}+\frac{\partial v_{y}}{\partial y}+\frac{\partial v_{z}}{\partial z}\right)dx dy dz \delta t$ (106)

Podemos então escrever que, por unidade de tempo,

$\displaystyle \mbox{fluxo total de $\vec{v}$\ nas faces}$$\displaystyle \;\;= \vec{\nabla}.\vec{v}\;\; \times\;\;$   Volume do cubo (107)

Esta é a essência do teorema do divergente. Para um volume delimitado por uma superfície fechada arbitrária, tomando-se em cada ponto da superfície a normal externa, temos

$\displaystyle \int \vec{v}.\vec{n} dS = \int \vec{\nabla}.\vec{v} dV$ (108)

Chega-se a este resultado ``reconstruíndo'' o volume (de forma arbitrária), com cubinhos, como se fossem peças de um Lego. Para cada cubinho vale o teorema, portanto vale para a soma. Note-se que a superfície na qual se calcula o fluxo é a superfície externa, pois cada superfície interna de um cubinho pertence a dois cubinhos, e a contribuição de uma ao fluxo cancela a da outra, já as normais têm sentido oposto.

Note-se que, tendo-se usado, da água, só a propriedade de que suas velocidades formam um campo vetorial diferenciável, o teorema é, na realidade, válido para quaisquer campos vetoriais diferenciáveis. Vamos fazer uso amplo dele para os campos elétrico e magnético, por exemplo.


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Henrique Fleming 2003-08-11