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Curvatura dos raios de luz

Considere a curva descrita pela extremidade do vetor $\vec{r}(s)$, onde $s$ é o comprimento da curva. Seja $\vec{s}$ o vetor tangente à curva em cada ponto. Se a curva for uma reta, a tangente em todos os pontos tem a mesma direção. Em curvas que não são retas, a tangente ``gira'' quando se percorre a curva. Este movimento da tangente é usado para definir a curvatura de uma curva como o vetor
\begin{displaymath}
\vec{K}=\frac{d\vec{s}}{ds}
\end{displaymath} (32)

Como o vetor tangente é $\vec{s}=\frac{\vec{R}}{ds}$, vemos que a curvatura é $\frac{d^2\vec{r}}{ds^2}$, ou seja é a ``aceleração'', se $s$ for tomado como o tempo.
Considere, por exemplo, um círculo, de equação $x^2+y^2=R^2$. Temos

\begin{eqnarray*}
x & = & R\cos{\theta}\\
y & = & R\sin{\theta}\\
dx & = & -R\sin{\theta}d\theta\\
dy & = & R\cos{\theta}d\theta
\end{eqnarray*}



e segue facilmente que

\begin{displaymath}
ds^2=R^2\sin^2{\theta}d\theta^2+R^2\cos^2{\theta}d\theta^2=R^2d\theta^2
\end{displaymath}

ou,

\begin{displaymath}
ds=Rd\theta
\end{displaymath}

Como $\vec{r}=R\cos{\theta}\vec{i}+R\sin{\theta}\vec{j}$, temos

\begin{displaymath}
\vec{s}=\frac{d\vec{r}}{ds}=-R\sin{\theta}\frac{d\theta}{ds}\vec{i}+
R\cos{\theta}\frac{d\theta}{ds}\vec{j}
\end{displaymath}

que dá

\begin{displaymath}
\vec{s}=-\sin{\theta}\vec{i}+\cos{\theta}\vec{j}
\end{displaymath}

Para a curvatura então temos:

\begin{displaymath}
\vec{K}=\frac{d\vec{s}}{ds}=\frac{1}{Rd\theta}(-\cos{\theta}d\theta\vec{i}-
\sin{theta}d\theta\vec{j})
\end{displaymath}

ou
\begin{displaymath}
\vec{K}=-\frac{\vec{R}}{R^2}
\end{displaymath} (33)

A curvatura é, então, um vetor, cujo módulo é

\begin{displaymath}
K=\frac{1}{R}
\end{displaymath}

A curvatura do círculo é tanto maior quanto menor o raio, o que mostra que a definição acompanha a idéia intuitiva.

Voltemos ao caso geral. Como o vetor tangente $\vec{s}$ tem módulo $1$2, de $\vec{s}.\vec{s}=1$ segue que
\begin{displaymath}
\vec{s}.\frac{d\vec{s}}{ds}=0
\end{displaymath} (34)

ou seja, $\frac{d\vec{s}}{ds}$ é perpendicular a $\vec{s}$. Logo, $\frac{d\vec{s}}{ds}$ pode ser escrito na forma
\begin{displaymath}
\frac{d\vec{s}}{ds}=\vec{A}\times\vec{s}
\end{displaymath} (35)

onde $\vec{A}$ é um vetor a determinar3De fato, considere o vetor
\begin{displaymath}
\vec{A}=a\; rot\vec{s}
\end{displaymath} (36)

onde $a$ é uma constante. Temos $\frac{d\vec{s}}{ds}=a\;rot\vec{s}\times\vec{s}$ e
\begin{displaymath}
(\frac{d\vec{s}}{ds})_i=\frac{d\vec{s}_i}{ds}=\frac{\partia...
...ds}
=\frac{\partial s_i}{\partial x^l}s^l=(\partial_ls_i)s^l
\end{displaymath} (37)

enquanto

\begin{eqnarray*}
(rot\vec{s}\times\vec{s})_i & = & \epsilon_{ijk}(rot\vec{s})_...
...})(\partial_l s_m)s_k=(\partial_l s_i)s_l-
(\partial_i s_k)s_k
\end{eqnarray*}



e o último termo é nulo, pois $(\partial_i s_k)s_k = \frac{1}{2}\partial_i(\vec{s})^2$, e $\vec{s}.\vec{s}=1$. Conseqüentemente,
\begin{displaymath}
\frac{d\vec{s}}{ds}=rot\vec{s}\times\vec{s}
\end{displaymath} (38)

Até agora falamos genericamente de curvas. Consideremos agora curvas que sejam raios de luz. Como vimos anteriormente, os raios de luz são ortogonais às superfícies $S=cte.$, ou seja, têm, em cada ponto dessas superfícies, a direção de $\vec{\nabla}S$. Em símbolos,
\begin{displaymath}
\vec{s}=\frac{1}{n}\vec{\nabla}S
\end{displaymath} (39)

Daí decorre que
\begin{displaymath}
rot(n\vec{s})=0
\end{displaymath} (40)

onde usamos o fato conhecido $rot\;grad=0$. Da Eq.(40) segue que

\begin{eqnarray*}
n rot\vec{s}+\vec{\nabla} n\times\vec{s} & = & 0\\
rot \vec{s} & = & \frac{1}{n}(\vec{s}\times \vec{\nabla} n)
\end{eqnarray*}



e, portanto, que

\begin{eqnarray*}
\frac{d\vec{s}}{ds} & = & \frac{1}{n}(\vec{s}\times \vec{\nab...
...\vec{s}.\vec{s}) \vec{\nabla} n-(\vec{s}.\vec{\nabla} n)\vec{s}
\end{eqnarray*}



e, finalmente,
\begin{displaymath}
n\vec{K}=\vec{\nabla} n-(\vec{s}.\vec{\nabla} n)\vec{s}
\end{displaymath} (41)

onde $\vec{K}$ é o vetor curvatura do raio. Uma conseqüência imediata da Eq.(41) é que em meios homogêneos ($n$ constante) a curvatura é nula, e os raios são retas. Uma outra aplicação é a seguinte: quando o Sol está muito baixo, no nascente ou no poente, os raios que atingem um observador são aproximadamente horizontais. O índice de refração da atmosfera diminui com a altitude, logo $\vec{\nabla} n$ aponta para o centro da Terra, ou seja, é vertical. Então, na Eq.(41), o segundo termo do segundo membro é muito pequeno. Conclui-se que a curvatura desses raios é paralela a $\vec{\nabla} n$, apontando para o centro da Terra. Os raios, isto é, se curvam para baixo. Em conseqüência, o observador, que interpreta sempre o raio como uma reta, ``vê'' o Sol mais alto do que está na realidade. De fato, isto explica por que se vê o Sol ainda um pouco depois de ele ter se posto.



\begin{picture}(300,100)(0,0)
\Curve{(20,65)(110,75)(200,65)}
\DashCurve{(110,...
...,85)(300,85){2}
\PText(110,35)(0)[t]{Curvatura de um raio de luz}
\end{picture}

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Henrique Fleming 2002-04-24