O PRÊMIO NOBEL DE FÍSICA DE 2004
O
prêmio Nobel de Física de 2004 foi concedido à David Gross da
Universidade da California, David Politzer do Instituto de
Tecnologia da California e Frank Wilczek do Instituto de Tecnologia de
Massachusetts, pela descoberta da liberdade assintótica na teoria das
interações fortes.
A força forte é uma das forças fundamentais da Natureza. Ela atua
nos quarks, os constituintes dos prótons, neutrons e outras partículas
elementares. Da mesma forma que a força eletromagnética atua nas
partículas que possuem carga elétrica, podemos atribuir uma carga aos
quarks e imaginar que a força forte atua nas partículas que possuem
essa carga. Convencionou-se chamar a carga das interações fortes de
COR; isso, porém, não tem relação alguma com o conceito usual de cor (que é
consequência da luz poder ter várias frequências e o nosso olho
distinguir essas diferentes frequências como diferentes cores). A carga
elétrica do elétron é -1 enquanto a carga elétrica de sua
antipartícula, o pósitron, é +1. Já a carga de cor assume tres
valores: cada quark pode ter uma carga de cor azul, vermelho ou
amarela, enquanto os antiquarks possuem cargas anti-azul, anti-vermelho
ou anti-amarela. Se juntarmos uma partícula com carga elétrica -1 com
outra de carga elétrica +1 obtemos uma partícula sem carga. O análogo
no caso dos quarks é que se juntarmos um quark com um antiquark,
qualquer que seja a cor, a partícula resultante terá carga de cor
nula, isto é, será incolor. Outra possibilidade de obter uma partícula
sem cor é associarmos três quarks, um de cada cor; a soma das três cores
produz uma partícula incolor. O que é mais interessante, entretanto, é
que todas as
partículas elementares encontradas na Natureza, incluindo o próton e o
neutron, são incolores!
A partícula que transporta a força eletromagnética é o fóton, o
quantum do campo eletromagnético, e o
comportamento do fóton e das partículas com carga elétrica é descrita
pela eletrodinâmica quântica. No caso das forças fortes, o quantum
dessa força é chamado de glúon, e a teoria que descreve a interação
dos glúons com os quarks é a cromodinâmica quântica. Diferentemente do
fóton, que
não carrega carga elétrica, os glúons carregam cor, isto é,
são coloridos. Mais do que isso eles sempre carregam duas cargas, uma
carga de cor e
uma de anticor. Como consequência, um glúon pode interagir consigo
mesmo, e também entre eles, criando fenômenos novos que não existem na
eletrodinâmica quântica.
No caso das partículas com carga elétrica sabemos que a interação
entre elas depende da distância. Para partículas em repouso, a força
elétrica varia com o inverso do quadrado da distância, a famosa Lei de
Coulomb. Cargas afastadas sentem uma força pequena enquanto cargas
próximas sentem uma força intensa. Quando levamos em conta os efeitos
da mecânica quântica a melhor maneira de descrever a interação entre
partículas carregadas e fótons é através de uma constante de
acoplamento que mede a intensidade da força entre partículas
carregadas. No caso da eletrodinâmica quântica a constante de
acoplamento é a constante de estrutura fina que é proporcional ao
quadrado da carga elétrica. Nas vizinhanças de uma partícula carregada o
campo elétrico é muito intenso e a mecânica quântica faz com que
pares elétron-pósitron sejam criados. Se a partícula carregada em
questão for um
elétron, os pósitrons criados tendem a se aproximar do elétron
enquanto os elétrons criados tendem a se afastar. Isso produz um
efeito de blindagem sobre o elétron e a constante de estrutura fina
parece ter um valor menor do que aquele na ausência dos efeitos
quânticos. Quando nos aproximamos da partícula carregada o efeito de
blindagem diminui e a constante de estrutura fina parece
aumentar. Podemos descrever
esse efeito através de uma constante de estrutra fina efetiva que
depende da distância em que é medida.
Portanto, na eletrodinâmica quântica, a
medida que as partículas carregadas se aproximam a constante de
acoplamento
efetiva aumenta e a interação entre elas é mais intensa.
Poderíamos imaginar que o mesmo sucede com os quarks quando
consideramos a carga de cor. Entretanto, experiências no final da
década de 60 mostravam que os quarks pareciam mover-se livremente
dentro dos prótons. Isso era bastante enigmático pois imaginava-se que
o efeito de blindagem também atuasse entre os quarks. O trabalho de Gross,
Politzer e Wilczek, em 1973, foi exatamente o de explicar esse fenômeno. Na
cromodinâmica quântica pares quark-antiquark também são
criados, levando ao efeito de blindagem como na eletrodinâmica
quântica. Porém, diferente do que acontece da eletrodinâmica quântica,
onde os fótons não carregam carga elétrica,
devemos agora levar em conta o efeito dos glúons, pois eles carregam
cor. O efeito dos glúons, entretanto, não é o de blindagem,
mas exatamente o oposto: a constante de acoplamento efetiva é tal que
a interação entre os quarks diminuiu à medida que eles se
aproximam. Esse efeito é chamado de anti-blindagem.
Qual dos dois
efeitos predomina, o de blindagem ou de anti-blindagem, depende do
número de espécies de quarks. Na
cromodinâmica quântica prevalece o efeito de anti-blindagem: a medida
que a distância entre os quarks diminui a constante de acoplamento
efetiva diminui e os
quarks movem-se como se estivessem livres. Esse é o fenômeno conhecido
como liberdade assintótica, que Gross, Politzer e Wilczek derivaram
à partir da cromodiâmica quântica, e por esse feito ganharam o prêmio
Nobel.
Poderíamos perguntar o que acontece quando a distância entre os quarks
aumenta. Sabe-se, das experiências, que não existem quarks livres e
porisso foi criada a hipótese do confinamento para explicar esse
fenômeno. À medida que
a distância entre os quarks aumenta são criados pares quark-antiquark
que formam novas partículas elementares e nunca um quark isolado. Isso
é semelhante ao que acontece quando tentamos dividir um imã ao meio
para obtermos um pólo Norte e um pólo Sul isolados. No final sempre
acabamos criando um par de imãs ao invés de dois pólos separados. Enquanto
podemos compreender porque isso acontece com imãs, o efeito do
confinamento permanece inexplicado na cromodiâmica quântica. A
anti-blindagem mostra que a constante de acoplamento efetiva cresce à
medida que os
quarks se separam, sugerindo o confinamento. Entretanto, nenhum cálculo seguro
pode ser efetuado, uma vez que tais cálculos só são válidos se a
a constante de acoplamento for
pequena e a teoria de perturbações puder ser aplicada.
Se a constante
de acoplamento não for pequena, não é possivel aplicar a teoria
de perturbações, e os cálculos tornam-se difíceis devido à
complexidade das equações da cromodinâmica
quântica. Simulações numéricas, por outro lado, podem ser feitas
e apesar de limitadas sugerem a existência do confinamento.
Há um prêmio de um milhão de dolares, oferecido pelo Clay Mathematics
Institute, para quem resolver esse problema de forma controlada.
Referências
Mais sobre liberdade assintótica
Mais sobre o prêmio do
CMI
Retorna